segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Um Cântico novo!



O livro de Apocalipse nos oferece hoje uma imagem de grande consolação. Enquanto os nossos dias passam muitas vezes como uma monótona e - porque não  - nauseante repetição de gestos, palavras e dinâmicas sempre iguais, no santuário do céu as coisas parecem ser bastante diferentes, ligadas a grandes surpresas.  


"Ouvi uma voz que vinha do céu; parecia o barulho de águas torrenciais e o estrondo de um forte trovão. O ruído que ouvi era como o som de músicos tocando harpa. Estavam diante do trono, diante dos quatro Seres vivos e dos Anciãos, e cantavam um cântico novo. Era um cântico que ninguém podia aprender; só os cento e quarenta e quatro mil marcados, que foram resgatados da terra". (Ap 14,2-3).

O vidente de Patmos assim descreve a vida daqueles cuja Páscoa de Cristo renovou a vida e o nome: “como um cântico novo”. Não as mesmas coisas as quais estamos habituados, não os mesmos labirintos dos quais não sabemos sair, não os mesmíssimos procedimentos marcadas pela indiferença e egoísmo que deixam os nossos dias vazios e sempre iguais a si mesmas. Um canto novo, uma vida nunca antes percebida, ao ponto que somente quem nela participa consegue acolher e saborear a melodia. O breve passo evangélico de hoje nos ajuda a compreender como tudo isto não é penas poesia, mas realidade concreta. 
  
 "Jesus ergueu os olhos e viu pessoas ricas depositando ofertas no tesouro do Templo. Viu também uma pobre viúva que depositou duas pequenas moedas. Diante disso, ele disse: “Em verdade vos digo que essa pobre viúva ofertou mais do que todos.Pois todos eles depositaram, como oferta feita a Deus, aquilo que lhes sobrava. Mas a viúva, na sua pobreza, ofertou tudo quanto tinha para viver”.(Lc 21,1-4).

Depois de observar a mesma procissão de sempre, Jesus se maravilha diante do gesto de uma pobre viúva, reconhecendo naquele gesto o cântico novo que fala a mesma linguagem do Evangelho. Assim como o Senhor Jesus fará na sua paixão, a viúva escolhe de não conservar nada para si: oferece as duas moedas a Deus como sinal de livre e completa restituição e de confiança da própria vida. Não é, de facto, a nossa miséria a separar-nos de uma maior comunhão com Deus e com o próximo. Pelo contrário, próprio a nossa pobreza, do qual podemos fazer uma livre e límpida entrega (em vez de conservar no bolso alguma réstia) nos subtrai ao risco de tornar supérfluo o dom parcial de nós mesmos. A vida é toda doada e recebida de Deus: por isso podemos restituí-la totalmente. Sem heroísmos nem triunfalismos. Cantando, finalmente e humildemente, um cântico novo. 

domingo, 25 de novembro de 2012

Cristo Rei!




Tu és o Rei dos judeus?
Os caminhos de Deus, nem sempre são os caminhos do Homem. Celebramos a festa de Cristo Rei, com uma passagem da Paixão do Senhor. Pode, na eminência da morte, celebrar-se a realeza de alguém? No diálogo com Pilatos, o Senhor revela-se, ajuda-nos a tocar o Seu mistério e a acolher a verdade da Sua missão.
Jesus não quis ser rei. Não quis, nem quer mandar, apenas propor. Não quis, nem quer dominar, apenas servir. Não quis, nem quer subjugar, apenas ajudar a levantar. A realeza de Deus questiona os nossos modelos de poder. Ele não deseja ser um chefe político. Cristo quer apenas reinar no nosso coração, não como ditador, mas como amigo, irmão, companheiro de viagem.
Jesus é um Rei que lava os pés aos seus discípulos, que percorre as ruas para tocar os pobres e beijar os doentes. Jesus é a imagem do poder de Deus que escuta, ampara, consola e se dá…

O meu reino não é deste mundo
Pilatos quer saber o que Jesus fez para chegar a esta situação. Um rei, não pode ser entregue à morte, não pode permitir a mentira, a injúria, a dor...Também nós fazemos perguntas a Jesus, interrogamos a Sua forma de atuar. É aqui, na sede, na procura da verdade, que Jesus faz uma catequese sobre a Sua forma de reinar.
O reino de Jesus é diferente dos reinos deste mundo, está marcado pela verdade. Este reino não se identifica com os poderes triunfalistas que conhecemos, mas com os valores mais profundos do Evangelho.
A moeda deste reino é a gratuidade, a bandeira é o amor, o hino é o Evangelho e o exército é formado pelos humildes. As armas dão lugar aos braços para acolher, os muros transformam-se em pontes para unir. A diferença é estímulo para a comunhão e a linguagem comum é a força do Espírito.
Vale a pena pertencer a este reino, ser pedra viva de um templo sempre em construção.

Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz
Sim, Jesus é Rei, para isso nasceu e veio ao mundo, a fim de dar testemunho da verdade. Propondo um reino diferente, Cristo Rei do Universo, é a verdade, a transparência do amor. Não uma verdade como ausência da mentira, mas a encarnação da essência de Deus amor. 
Só os que estiverem abertos à verdade poderão acolher esta proposta de pertencer a um reinado diferente dos do mundo. Só os que estiverem abertos à verdade poderão escutar em profundidade a catequese criativa do amor que deseja construir em cada coração um altar. Só os que estiverem abertos à verdade, poderão entender a mensagem do Senhor que é Rei. Só estes farão parte do reino.
Não nos é indiferente este reino, num mundo cheio de propostas ditatoriais, mesmo que discretas. Ansiamos a fraternidade, pois compreendemos que as escadas do poder só separam e subjugam. Precisamos acreditar neste Rei manso e humilde de coração e crer que nasce já em nós esta semente do Reino.
A feliz esperança num Reino de amor, não pode ficar guardada nas gavetas da nossa vida pessoal como uma verdade passiva que não nos transforma. Urge sair para a rua, ser soldado do reino em que acreditamos e gritar a novidade do Espírito em cada gesto. Precisamos de mapa, de um guia, de uma norma para fazer parte deste reino? Procura o Evangelho e descobrirás a verdade!

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Inúteis!


Terça Feira da XXXII Semana do Tempo Comum

Não é exactamente a primeira coisa que desejamos ouvir dizer de manhã cedo logo ao despertar, o elogio que reservamos às pessoas especiais, nem tão pouco o epíteto que nos escapa da boca nos momentos da raiva. No entanto o Evangelho, quando quer fazer-nos grandes dons e definitivas revelações, não se perde em eufemismos e nos anuncia - simplesmente - a verdade.

«Assim também vós, quando tiverdes feito tudo o que vos foi ordenado, dizei: ‘Somos inúteis servos: fizemos o que devíamos fazer’».
 (Lc 17,10).

Somos inúteis, isto é não necessários, não indispensáveis. Sabe-se lá porque, muitas vezes, perdemos este elementar sentido da (nossa) realidade e nos metemos num mar de preocupações tanto absurdas quanto infundadas?! Com estas palavras o Senhor Jesus nos ajuda a perder aquela grande confiança em nós mesmos que nos paralisa o coração, e encaminha-nos para aquela pequena confiança nele que nos emerge na grande capacidade de amar e de oferecer a vida. Enquanto estivermos a medir os gestos e as palavras em base aos resultados, permaneceremos num triste e prudente cálculo económico, onde não existem grandes perdas, mas não existem também autêntico amor. Se, pelo contrário, iniciamos a fazer as coisas sem esperar nada em troca, entramos numa paz profunda e numa grande liberdade. Certo, nós preferimos sentir-nos sempre úteis e, sobretudo, manipular os outros - muito, muito elegantemente - sempre a nosso favor.    

«Quem de vós, tendo um servo a lavrar ou a guardar gado, lhe dirá quando ele volta do campo: ‘Vem depressa sentar-te à mesa’? Não lhe dirá antes: ‘Prepara-me o jantar e cinge-te para me servires’?» (17,7-8). 

Afortunadamente, a realidade é (sempre) mais bela dos nossos projectos e das nossas ilusões. Só Deus é necessário. Nem nós, nem os outros o somos. O mundo poderia ir pra frente muito bem mesmo sem nós e - provavelmente - um dia o fará! No entanto a nossa vida é importante. É precioso aquilo que hoje teremos a ocasião de fazer para e com amor. Somos inúteis, e deveremos começar a aproveitar esta liberdade recebida. As coisas úteis, por definições, são determinadas por uma função e por um escopo. O sentido da nossa vida, ao contrário, nos liberta de qualquer utilitarismo. De nós, não existia necessidade, no entanto o Senhor quis doar-nos primeiro a vida e depois ele mesmo. Como conter um sorriso e uma satisfação diante de tanta beleza?! 

«manifestou-se a graça de Deus, fonte de salvação para todos os homens[...]
Jesus Cristo, que Se entregou por nós» (Tt 2,11.14)

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Atentos!


Segunda Feira da XXXII Semana do Tempo Comum

As Escrituras, hoje, nos oferecem uma série de recomendações todas em vista à construção em nós de “uma autêntica religiosidade” (Tt 1,1). É sempre muito forte o risco - sobretudo para os crentes - de confundir a voz de Deus com medos e desejos que bramam seguranças, em vez de identificar-la com aqueles doces e audazes apelos que desejam “levas à fé” (Tt 1,1) os passos da nossa vida. O Senhor Jesus no Evangelho, depois de chamar a atenção dos discípulos sobre o perigo de escandalizar os pequenos na fé com o seu comportamento, recomenda uma particular forma de vigilância. 

« Tende cuidado. Se teu irmão cometer uma ofensa, repreende-o, e, se ele se arrepender, perdoa-lhe. Se te ofender sete vezes num dia e sete vezes vier ter contigo e te disser: ‘Estou arrependido’, tu lhe perdoarás» (Lc 17,3-4).

Escandalizar significa ser ocasião de tropeço para o outro, impedir-lhe o caminho mediante obstáculos que o obriga a cair por terra. É isto, de facto, que nós fazemos todas as vezes que deixamos de perdoar e dizemos: “agora ghega, já não aguento mais!”. Certo, o perdão não exime do dever de ajudar o outro a tomar consciência do mal que está operando. Todavia, exprime a sua invencível força próprio na disponibilidade em acolher sem reservas, tornando-se naquele sinal de confiança capaz de fortalecer a fraqueza do irmão. Compreensível a reacção dos discípulos: 

« Aumenta a nossa fé!».
O Senhor respondeu: «Se tivésseis fé como um grão de mostarda, diríeis a esta amoreira: ‘Arranca-te daí e vai plantar-te no mar’, e ela vos obedeceria» (17,5-6).

É preciso, certamente, fé para perdoar e, sobretudo, para continuar a fazê-lo. Mas o problema da fé não é antes de tudo uma questão de quantidade, mas de qualidade. As palavras de Jesus parecem dizer que fé, na verdade, não é preciso muita, porque um grãozinho é já suficiente. Ocorre fé na fraqueza do Evangelho, na loucura do amor que (sempre) reabre os caminhos interrompidos. Ou melhor, mais que uma pequena fé, o Senhor nos pede para termos uma fé atenta ao pequeno e ao ordinário. Não os clamorosos gestos - com os quais muitas vezes procuramos apenas manter Deus longe da nossa consciência - mas as pequenas atenções quotidianas exprimem e constroem a fé em Deus. Aquela atenta e serena vigilância sobre o mundo que está dentro e fora de nós, única forma de amor que nos impede de não adiar nunca o domínio e o dom de nós mesmos. 

sábado, 10 de novembro de 2012

Um gesto autêntico...



Quem te avisa…
Perante o aviso de Jesus, com que o texto começa, podemos pensar: se ele diz “acautelai-vos” estará a advertir para algo que vem de fora, para o qual me devo precaver. Uma análise mais séria leva a adentrar-me pelas avenidas do meu ser e a descobrir esse escriba enterrado nas minhas motivações. Não será esse escriba o responsável por destabilizar a minha humildade e verdade face aos outros? Talvez seja ele o que coloca um verniz à frente da minha falta de autenticidade; talvez seja ele a ditar-me certas regras de competição desenfreada, de busca de atenções, de defesa dos “meus direitos”, de uma implacável indiferença perante os detalhes do irmão. Urge, então, localizar e denunciar esse escriba… E esse escriba provavelmente sou eu!
Não tenho hipótese de ludibriar Deus com a soma avultada do meu trabalho pelo seu Reino, com a incontável lista das minhas obras de piedade, com a sobra de palavras... Deus não se suborna com esmolas. O desafio que Jesus me deixa é o de converter a minha vida interior, num manancial a fundo perdido...

Veio uma pobre viúva
Mas a viúva pobre também nos vem causar problemas. Primeiro: que estranho este Deus que se compraz nos pobres, que simpatiza com os fracos! Teremos de passar pela penúria para que Ele se interesse por nós? Segundo: como pode ser elogiada a tremenda imprudência desta mulher que dá tudo o que tem? Ela vai agravar a crise humanitária, é mais uma na conta dos que têm de ser socorridos pela assistência social… 
Há aqui qualquer cumplicidade entre ela e Deus que, à primeira, nos escapa. A nossa lógica é a independência… face a Deus e face ao outro. Não toleramos pensar que somos indigentes, que, de algum modo, dependemos dos outros, ainda que o Outro seja Deus. Gostamos muito mais de ser nós a dar esmolas, a mostrar, a ostentar… a deixar um débito na conta do outro e cobrar-lhe juros quando se proporcionar. No fundo batemos sempre na mesma tecla: queremos colocar-nos no lugar de Deus. A pergunta que temos de fazer é esta: qual é o nosso Deus? Ou seja, para onde encaminhamos a nossa confiança?

O que é dar?
Os ricos davam, a viúva deu? Na verdade, nós nunca damos nada. Tudo o que nos passa pelas mãos é pura gratuidade de Deus. Vivemos num ambiente em que tudo é (de) graça. Não se trata de deixar de lado o nosso esforço, nem de enveredar pela atitude passiva de quem acha que tudo se resolve por si. Trata-se de deixar fluir pelas nossas mãos a incomensurável riqueza de Deus que é nossa, mas é d’Ele. Trata-se de lhe dizer: confio em ti, e entrego-te aquilo que de ti recebo, o que tenho e sou; é na tua presença que me abrigo, é sob o teu horizonte que sonho, é da tua vida que me alimento é para o teu rosto que caminho. 
Amigos e amigas, a viúva pobre é um perfeito ícone da nossa condição perante Deus. É pobre de bens e é viúva… pobre de relações. Ela é a expressão de uma pura dependência de Deus. Porque é Ele o sustentáculo das coisas que fruímos e das pessoas que amamos. É Ele Quem dá valor aos bens, e a beleza a tudo o que é belo. Só n’Ele integramos a profundidade e a verdade de nos amarmos. É Ele o único pelo qual podemos aferir a nossa gestão de bens e de relações. A oferta da viúva é tudo o que tem para viver, é a sua vida e ela manifesta um percurso claro para a sua vida: vem de Deus, vai para Deus, pois está em Deus. E isto porque… verdadeiramente tudo o que possuímos para viver é Deus. E isto é Evangelho!

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Uma multidão imensa!


Hoje fazemos memória da estupenda companhia dos santos, irmãos e irmãs que viveram bem os seus dias neste mundo e entraram já no mistério da vida eterna e na comunhão com Deus. Devemos recuperar um olhar mais sério e sereno em relação a estas figuras, porque muitas vezes delas temos uma opinião um pouco idealizada. Em vez de tê-los como preciosos companheiros de viagem na aventura da vida, os vemos como personagens extraordinários e impossíveis de serem imitados, bastante longe da mediocridade dos nossos dias. Como sempre, convém baixar o olhar sobre as Escrituras para descobrir o que a Palavra de Deus diz deles.  

Tantos

No Livro do Apocalipse recebemos já uma surpreendente notícia: os santos são tantos, tantíssimos! Não é verdade que as pessoas boas e justas são poucas no mundo, o vidente de Patmos afirma que os santos são “uma multidão imensa, que ninguém podia contar, de todas as nações, tribos, povos e línguas” (Ap 7,9). Certo, nós somos sempre mais inclinados a colocar em primeiro plano os maus e os injustos segundo o costume impregnado nos meis da comunicação social. Porque é na nossa natureza exorcizar aquilo que nos mete medo e nos aterroriza exibindo-o. Com esta operação iludimos que estamos a tolerar a nossa condição, observando como alguém, no fundo, esteja muito pior que nós. Para Deus, porém, aquilo que brilha e merece der destacado é o bem e a grande assembleia de pessoas que fizeram ou fazem o bem. 

Nós
Todavia “aquilo que seremos não foi ainda revelado” (1Jo 3, 2), porque continuamos pessoas livres e em caminho para a eternidade. Portanto esta nossa condição de santidade é uma pequena semente que devemos defender e fazer crescer, confiada à nossa responsabilidade e à nossa livre escolha. Deus nos dá tudo mas não pode obrigar-nos a tornamo-nos filhos amados. Eis então o Evangelho das bem-aventuranças (Mt 5,1-12), a retirar-nos do triste engano de uma cultura que continua a afirmar que para tocar o céu com um dedo-para ser feliz- é necessário ocupar um prestigioso papel social, conquistar gratificações e reconhecimentos através dos instrumentos   do possesso e do poder. 
As bem-aventuranças proclamam, no entanto, que estrada para a vida plena  não está fora, mas dentro de nós. Nos asseguram que não é verdade que somos todos destinados à felicidade. É verdade exactamente o contrário: Deus nosso Pai, desde sempre, destinou-nos a felicidade. A chave da alegria autêntica não está em cima dos nossos desejos frustrados, mas no fundo da nossa consciência daquilo que somos. As bem-aventuranças são o convite a acolher aquilo que cada um deve ser com gratidão, rejeitando a ilusão qua a vida possa mudar pela intervenção de algo externo e estranho a nós mesmos. 


Atualidade

O carinho do Papa Francisco que irrita muitos padres

É uma coisa maravilhosa mas, por exemplo, também João Paulo II foi à cadeia encontrar o seu assassino Ali Agca. Mas desta vez, aposto, ...

Aqui escreves TU