Pede à Quaresma que te ensine
Pede à Quaresma que te ensine
«E logo o espírito o impeliu para o deserto.
E ele esteve no deserto quarenta dias,
sendo tentado por Satanás» (Marcos 1, 12).
Pede à Quaresma que te ensine o caminho do deserto.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho do deserto.
Para que o teu coração se deixe purificar.
Da tentação de tudo possuir.
Do egoísmo do não-compromisso.
Da ganância do isolamento.
Ou da omnipotência de tudo realizar.
E querer ser deus.
E da ousadia de não saber esperar.
E da certeza de possuir a verdade.
Pede à Quaresma que te mostre o caminho do deserto.
Pede à Quaresma que te mostre o caminho do deserto.
Onde Jesus te dará o pão da Palavra e do silêncio.
No deserto o coração saberá encontrar
o silêncio que regenera e reinventa.
No deserto o silêncio fará do teu coração uma fonte
de onde pode jorrar a verdade de Deus.
«Seis dias depois,
Jesus tomou consigo a Pedro, Tiago e João,
e os levou, sozinhos,
para um lugar retirado sobre uma alta montanha.
Ali foi transfigurado diante deles» (Marcos 9, 2).
Pede à Quaresma que te ensine o caminho da montanha.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho da montanha.
Para que ouses subir ao lugar do encontro
com o Deus da vida e da história.
Na montanha contemplarás o Rosto.
E fixarás nele o olhar.
E descobrirás nele o teu rosto.
E contemplarás todos os horizontes.
Os do teu coração
e todos aqueles onde o humano se espraia em tantos desafios.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho da montanha.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho da montanha.
E ousarás descer para que o teu olhar de encantamento
incendeie a vida por onde passas.
E sejas sinal de ressurreição.
«Chegou, então a uma cidade da Samaria, chamada Sicar…
Ali se achava a fonte de Jacob...
Uma mulher da Samaria chegou para tirar água.» (cf. João 4, 5-7).
Pede à Quaresma que te ensine o caminho do poço de Sicar.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho do poço de Sicar.
Sentado à beira desse lugar de encontros singulares
está Alguém que te oferecerá água viva.
Outrora uma samaritana deixou-se enamorar
pelo olhar e pelo coração livre de um sedento.
Também ela não ousou recusar dessa água
que sacia todas as sedes.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho do poço de Sicar.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho do poço de Sicar.
Para que Deus se sente contigo e te sacie.
E o teu poço-coração possa recriar-se e ser fonte.
E alimentar outras nascentes.
Também as que teimam em não jorrar.
E saciar todas as sedes
e as de todos os que se cruzam com a borda do teu poço.
«Partiu, então, e foi ao encontro do seu pai.
«Partiu, então, e foi ao encontro do seu pai.
Ele ainda estava ao longe,
quando seu pai viu-o, encheu-se de compaixão,
correu e lançou-se-lhe ao pescoço,
cobrindo-o de beijos» (Lucas 15, 20).
Pede à Quaresma que te ensine o caminho para o abraço de Deus.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho para o abraço de Deus.
O caminho para esse lugar onde a festa nunca termina.
O caminho para esse lugar de onde saíste
para viver a vida do sem rumo e do sem sentido.
Porque querias ser livre.
Porque querias escutar as mil melodias
que ainda não tinham sido tocadas no teu coração.
Em vez disso a vida empurrou-te para um lugar de desespero
onde nem as bolotas eram tuas amigas.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho para o abraço de Deus.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho para o abraço de Deus.
E ousa recomeçar.
E ser filho.
E vestir o traje da festa
que o Amor prepara para ti a todo o instante.
«Não é preciso que vão embora.
«Não é preciso que vão embora.
Dai-lhes vós mesmos de comer» (Mateus 14, 16).
Pede à Quaresma que te ensine o caminho do coração do irmão.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho do coração do irmão.
Daquele que está debruçado sobre o próprio coração em sangue.
O coração daquele que a vida atirou para a beira da estrada
e que agora espera um qualquer samaritano.
O coração e a vida daquele que este tempo defraudou
espera que tu sejas consolo e abrigo.
Também abraço.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho do coração do irmão.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho do coração do irmão.
E ousa partilhar da tua pobreza. Daquilo que mesmo fazendo-te falta
suavizará a dor de quem já nada tem.
De quem já não tem onde morar ou de que se alimentar.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho da partilha
e o coração do irmão pulsará com renovada esperança.
“Se o grão de trigo que cai na terra não morrer, permanecerá só:
mas se morrer, produzirá muito fruto” (João 12, 24).
Pede à Quaresma que te ensine o caminho de Jerusalém.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho de Jerusalém.
A cidade santa espera que os teus passos
sigam firmes na senda d’Aquele que já fez o mesmo caminhar.
Arrisca nesse seguimento.
Mesmo que a luz teime em esmorecer dentro de ti.
Mesmo que te impeçam de caminhar atrás do Mestre.
A cidade santa espera por ti.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho de Jerusalém.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho de Jerusalém.
Porque a vida e a felicidade que tanto desejas
também passa por lá.
Não ouses voltar as costas à cruz que a cidade te entrega.
Segue atrás desse desejo de vida
que nenhuma dor será capaz de enterrar.
Pede à Quaresma que te ensine o caminho de Jerusalém.
E deixa-te morrer.
A terra que és será nova
quando o milagre do grão de trigo irromper.
P. Manuel Afonso de Sousa, CSh
Diretor espiritual
Diretor espiritual
do Seminário Conciliar de S. Pedro e S. Paulo, Braga
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