quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Longa e estreita!



Quarta Freira - XXX Semana tempo comum

Não, não se trata de uma túnica muito na moda no tempo de Jesus. Nem de um tipo de prato gostoso típico da Palestina. O título escolhido é a discrição conjunta que as Escrituras de hoje fazem daquela vida intensa daquela vida intensa e feliz que o Senhor indica ao homem. Ilustrando o sentido do quarto mandamento (honra o teu pai e a tua mãe), S. Paulo fez o elogio da obediência como a melhor garantias para um futuro próspero.

“É o primeiro mandamento acompanhado de uma promessa: «para que sejas feliz e tenhas vida longa sobre a terra»”. (Ef 6,2-3)

A mesma recomendação é também dirigida aos pais, que devem obedecer aos filhos tornando-se sábios educadores. Portanto, aos patrões e aos escravos, que podem até prestar um mútuo serviço, “como quem serve o Senhor e não aos homens” (Ef 6,7). O motivo deste convite à obediência feito sem nenhuma discriminação de papéis e circunstâncias nasce da consciência que Deus in primis quis ser obediente à nossa humanidade. Até à morte.

«E vós, senhores, tratai os vossos servos do mesmo modo; evitai as ameaças, pois sabeis que tanto eles como vós tendes o mesmo Senhor, que está no Céu e não faz distinção de pessoas.» (6,9).

De facto não deve ser entendida como uma discriminação que se cumprirá nos últimos tempos a ameaçadora palavra de Jesus no Evangelho, mas sim como um urgente apelo ao nosso coração muitas vezes cheio e distraído.    

«Esforçai-vos por entrar pela porta estreita, porque Eu vos digo que muitos tentarão entrar sem o conseguir». (Lc 13,24).

Jesus faz apelo a um outro recurso muitas vezes sub-utilizada, de modo particular hoje na sociedade dos comfort e dos benefits: a capacidade de combater sobretudo contra nós mesmos e as infinitas atitudes a fazer-nos sempre esperar pelos compromissos mais importantes, para lembrar-lhes sempre demasiado tarde. 

ficareis fora e batereis à porta, dizendo: ‘Abre-nos, senhor’; mas ele responder-vos-á: ‘Não sei donde sois’.  (Lc 13,25).

Para não correr o risco de tornar-se estranhos à vida e a Deus que nos ensina a enfrentá-la, a mensagem é claro: recomeçar a obediência e o combate. Obedecer significa alargar os confins do olhar e do coração, dilatar os espaços de vida para si e para os outros. Lutar, porém, significa encontrar motivos e coragem para escolher uma coisa entre as outras, para permanecer fiéis e não deixar-se fascinar pelas muitas propostas de estradas e caminhos. Só assim a vida passa a ser um percurso feliz e de medida perfeita: longa e estreita.   

sábado, 27 de outubro de 2012

Fé que salva!


…pedir esmola à beira do caminho
O texto começa por descrever a situação do pobre cego, imerso na passividade. Está parado, dependente e insuficiente. Está à beira do caminho, e ali podia continuar, assistindo ao rumor da multidão que passa, não lhe interessando quaisquer sons, senão o das moedas a tilintar na escudela. Podemos reconhecer-nos neste cego, parado e pedinte, porque sabendo nós bem como é preciosa a visão, não é tão óbvio atinar que tenhamos falta dela. Podemos até conviver bem com a cegueira, ancorados à noite, ou à fixidez dos nossos critérios, vivendo a vida que nos sobra dos outros, dependentes do que o movimento dos outros nos dita, abrigados sob a capa de tantas escravidões. A visão traz-nos desafios; levantar-nos e atirar com a capa, exige coragem!
Jesus caminha, o cego está à beira do caminho. É cego, mas um sentido ele tem: “ouviu”. “Ouviu dizer”, talvez também tenha ouvido caminhar. E àquele homem, que ouve e lê o som dos passos de Jesus, deixam de bastar as esmolas da terra, o caminhar dos outros e o negrume da noite. Tudo começa com a escuta atenta. Se ouvimos o som dos passos de Jesus, pode acontecer que o nosso coração comece a bater em uníssono com o seu ritmo caminhante. Jesus é o divino viandante que convoca a nossa capacidade de locomoção. Ele é Aquele que questiona a nossa inércia. Ele é Aquele que traz a luz e alvoroça a noite. Ele é o único que tem a meta!

Um grito e um salto
A decisão do cego move-se entre atitudes controversas com as quais também nos podemos identificar. Ordenavam-lhe que se calasse. Controlam a agenda de Jesus, fazem a triagem sobre quem deve ou não “incomodar” Jesus e quando. Mas todo o ser humano deve ter espaço para um grito e um salto que chegue ao céu. Se Jesus é Aquele que caminha sempre e que responde a uma urgência, Ele nunca leva pressa. A urgência de Jesus é cada um de nós, porque é a urgência do amor, a única urgência da vontade do Pai: salvar-nos, convidar-nos a fazer caminho. Jesus gosta de ser incomodado. A melodia de uma caminhada deve ser embelezada com pausas e com o contraponto de encontros, harmonizada com mediações. Jesus diz: “Chamai-o”… a divina delicadeza de nos fazer participantes dos seus milagres! Em cada um de nós Ele delega um detalhe da sua missão salvadora. Somos portadores da mensagem que é segredo da salvação. Não são os nossos gestos que salvam, mas têm a missão de apontar a salvação: “Coragem! Ele está a chamar-te”. 

Vai: a tua fé te salvou
Mas o grito do cego não vai logo direto ao assunto, parece ser ambíguo: “Tem piedade de mim!” é um pedido que pode ter muitas leituras. Não queria ele a visão? Porque rodeia? O cego não apresenta a Jesus uma cegueira localizada, mas o complexo de cegueiras de todo o seu ser. É este o segredo da fé: lançar-nos por inteiro nas soberanas e sapientes mãos de Jesus. O cego não deu instruções de cura ao curador… mas confiou. Porém, bem sabia qual era o seu ponto fraco… Os milagres de Jesus são milagres porque demandam fé, uma confiante entrega. Não há automatismos. A fé é a porta que abre a salvação! Quando alguém recupera a vista não mais quer perder a luz, por isso o cego seguiu Jesus, seguiu a fonte da Luz.
Caros amigos e amigas, há homens e mulheres sentados à beira do caminho que leva a Jerusalém. A sede encardida à beira da fonte, os passos cativos à beira do caminho, os olhos vedados sob o calor da luz. E a interpelação da nossa fé tem de nos levar a ter e a dar coragem pois há um chamamento, há Evangelho!

sábado, 13 de outubro de 2012

Deixar e receber!


Porque me chamas bom?
A pergunta de Jesus soa-nos estranha. Então Ele não é bom?! Provavelmente aquele jovem busca Jesus como se fosse mais uma peça para adicionar à sua coleção de “valores”. Jesus desengana-lhe a perspetiva, deixando a Deus a exclusividade do adjetivo bom. Se não há Deus, não há bom, porque é Deus que dá o valor e a bondade ao bem… mesmo ao cumprimento dos mandamentos! Jesus desconcerta as nossas noções de bondade, epidérmicas, relativas e viciadas. Ele mostra-nos que a bondade se situa num patamar que nos obriga a uma “peregrinação”, ao mesmo tempo gozosa e dolorosa. Jesus, assim buscado pelo jovem, não fica bem entre o mofo das suas coleções, como soma do seu património. Jesus não pode ser buscado como mais um, Ele é a peça que completa, a única que falta e a que dá valor a tudo o mais.

Faltava-lhe uma só coisa
Uma coisa? Mais nada?! Faltar uma só coisa é fácil, pensará este jovem, certamente bem intencionado, que já conseguiu tantas “coisas”! E depois depara-se com a realidade: o que lhe falta é realmente tudo.
Nós queremos ter tudo e… ter Deus também, não propriamente que Deus nos tenha. E depois acabamos por ficar possessos dos bens. O jovem mostrou que, mais do que possuir bens, eram os bens que o possuíam, pois não o deixaram desprender as asas. Jesus convida-nos a alargar os horizontes das nossas ambições e dá-nos o segredo para ter tudo: abandonar-nos a Deus. O reconhecido “gestor de bens” S. Francisco de Assis, confirma a receita: “Nada de vós mesmos retenhais para vós, a fim de que totalmente vos possua Aquele que totalmente a vós se dá”. Possuir Deus é deixar que Deus me possua e me ame, ainda que tenha de vender e dar. E isso não é empobrecer, é a inteligência de desobstruir o caminho para o amor de Deus. É apenas do colo de Deus que manam os bens de primeira necessidade… a vida e o amor. Cingidos a Ele é possível agarrar a luz de cada dia, resplandecer com o olhar do outro, partilhar a riqueza da terra, navegar nos mares das relações, sorver a beleza que nos envolve, sorrir a um universo inteiro, abrigar-se sob o azul do céu, saciar-se da alegria… Tudo isso e mais… não pode ser pago com qualquer riqueza: é a conta de um amor exorbitante.

Um tesouro único, neste olhar único
É difícil de ouvir a Jesus que ninguém se pode salvar. E nós achamos que sim, que controlamos a nossa salvação, com alguma reserva de valor. Até o espontâneo Pedro, depois de tudo que ouviu, faz notar a Jesus o seu despojamento para O seguir, como se essa fosse ainda uma moeda de troca para outra recompensa, como se estar com Jesus não fosse bastante, como se Ele não fosse a saciante recompensa!
Por duas vezes neste texto o olhar de Jesus irrompe como um fogo. Amigos e amigas, como posso não me deixar possuir por este olhar único, que repara em mim, não me ignora, acredita em mim e me promove? Este olhar contém as possibilidades de todos os impossíveis; é o olhar do Criador que vê o bem, que se deleita na sua obra, que não cessa de embelezar e enriquecer o meu ser e que quer fazer de mim o seu Evangelho! 

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Dignidade da fé!


Vivemos tempos fascinantes, mesmo se de alguns anos pra cá a crise económica fustiga fortemente a humanidade, seja a escala nacional, seja a escala internacional. O progresso tecnológico contínua a abrir possibilidades sempre novas e nunca suspeitadas. Alguns valores morais são afirmados e defendidos melhor hoje que ontem, mesmo se nem sempre são respeitados. É o caso, por exemplo dos direitos humanos  e das conquistas sociais. 
O nosso contexto cultural tornou-se muito eclético: correntes de pensamento de todo o tipo coexistem com alguma dificuldade mas também com evidente sucesso. Os cristãos contribuíram ao progresso social, científico e cultural da humanidade, mas pode-se perguntar-lhes: “porque sois cristãos?” Ou “o que significa para vós e para os outros ‘ser cristãos’ numa sociedade onde todos somos diferentes extrações culturais, e sociais?” já não vivemos num ambiente cultural homogéneo e, mais ainda, somos cristãos na diáspora, espalhados no meio aos nossos contemporâneos que não pensam como nós. Neste contexto somos provocados pelo convite: “reconhece, ó cristão, a tua dignidade! Diz quem és e em quem puseste a tua fé”. Mas como dizer quem somos sem fazermos referência á fé de todos aqueles que nos precederam e de todos aqueles que, espalhados pelo mundo, vivem a mesmíssima fé? Antes de ser cristão no singular, nós temos uma tradição, um “credo”. Somos um “povo”, uma comunidade, uma Igreja. 
Para muitos dos nossos contemporâneos a fé cristã não consegue satisfazer as necessidades quotidianas. Não faz feliz, não resolve os nossos problemas, não cura as nossas feridas, não oferece paz ao coração, salvação, libertação. 
Entretanto a cura do homem na sua globalidade - corpo, coração e alma - é o núcleo da mensagem de Jesus. Jesus cura o paralítico no mesmo momento em que lhe perdoa os pecados. A palavra salvação significa, então, cura e perdão dos pecados.
Crer é apoiar-se em alguém. A nossa profissão de fé não começa com um “creio que Deus existe”, ou “creio que Deus é omnipotente”, mas com um “creio em Deus”. Colocar a própria fé em alguém é  muito mais que um simples confiar no que ele afirma ou no que se diz dele: fiar-se de Deus significa considerá-lo digno de fé e merecedor da nossa fidelidade. Se note ainda que não dizemos: “Deus, eu creio em ti!”. Não, nós proclamamos a nossa fé diante da Assembleia: “Eu creio em Deus”.  Proclamando a nossa fé nós dizemos quem é Deus e o que fez por nós. Em outras palavras: o nosso acto de fé tem um conteúdo. 
Quem acredita não pode calar a própria fé. São Paulo não podia não dizer: “Ai de mim se não evangelizar” (1cor 9,16). Exprimir a própria fé no Senhor é tarefa de todos, segundo as suas possibilidades: “o escândalo não é que Cristo seja morto, mas que ele ressuscitou. Este escândalo se transmite de um para o outro através de mensageiros ilustres e insignificantes. É contemporâneo a cada um de nós e cada um o exprime como pode, seja ele teólogo, filósofo, místico ou artista, ou, simplesmente com a sua vida” (Pierre Emmanuele).     

sábado, 6 de outubro de 2012

Amor inteligente!


Dureza do vosso coração
Jesus, mestre supremo, acolhe as dúvidas e preocupações dos fariseus como ponto de partida para uma catequese sobre o respeito e a comunhão. O projeto original de Deus convida à fidelidade e à igualdade de direitos. Confrontado com a questão do repúdio das mulheres, inscrita na lei, não pela sua essência mas pela dureza do coração dos homens, Jesus propõe a aliança como caminho e meta. Deus quer uma vida mais digna e segura para as esposas mal tratadas pelo homem que se foi baseando na lei da superioridade masculina. Hoje, seguidores de Jesus Mestre, não podemos legitimar nada que promova a discriminação ou exclusão da mulher. Jesus continua a propor-nos que renunciemos à “dureza do nosso coração”, impermeável à bondade e ao diálogo.

Não separe o homem o que Deus uniu
Falar de fidelidade, de compromisso, parece já não ser tema. Também no tempo de Jesus surge a necessidade de recordar a importância da união matrimonial. Se acreditamos que Deus nos ama e em tudo concorre para nosso bem, porque tendemos a destruir o que pelas Suas mãos constrói? Porque teimamos em separar o que Ele uniu? Ou não foi Ele que criou os laços que nos pertencem?
Podemos considerar o amor espontâneo, como algo que vem e vai, sem raiz, em que a primeira tempestade deita por terra o pouco que foi construído. Será esse o amor que Deus derrama em nossos corações?
Podemos afirmar que o casal não se basta a si e é sempre natural encontrar fora dele, algo mais que sacie os seus desejos pessoais. Será essa a fidelidade que o Senhor nos ensina?
O amor verdadeiro, que se prova na dúvida, na dor e no tempo, jamais passará. É esse o único amor. Aquele que permanece na tempestade, porque enraizado numa relação a três: ele, ela e Deus. Quando Deus constrói o amor, ele permanece. Quando não há Deus, também não há amor…

Deixai vir a mim as criancinhas
Tal como os discípulos, também nós estorvamos, por vezes. Não somos sinal, instrumento que conduz a Deus. Interrompemos a corrente de amor, que nasce do coração de Deus, com os nossos julgamentos, desejos e interesses. Esquecemos o diálogo como fermento de comunhão. Esquecemos o olhar, como estrada para o perdão. Esquecemos o abraço, como porta do coração. Esquecemos a palavra dada, o compromisso, o fulgor e a paixão do início, porque deixamos o nosso coração de pedra ficar de plástico para ser deitado fora. Aprendamos com Jesus, a simplicidade das crianças, o acolhimento, a fidelidade. Aprendamos com Jesus a construir um coração de carne, atento, fiel. Sejamos crianças, dóceis, sedentas do verdadeiro amor que nos faz crescer. Sejamos crianças, sinceras, transparentes, fiéis ao amor. Sejamos Evangelho!

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Arauto do Grande Rei


Nasceu em Assis, na Úmbria, Itália, entre 1181 a 1182; deram-lhe o nome de João no baptismo, mas uma circunstância casual - o facto de o pai se encontrar na França quando ele veio à luz - determinou que fosse sempre designado com o nome de Francisco, que quer dizer o Francês.
Não nasceu santo, pois até aos 25 anos viveu como um de tantos outros jovens: alegre, divertido e amigo de festas.
Para defender a sua terra contra Perúsia, tomou as armas aos 20 anos e foi aprisionado. Em 1202 alistou-se outra vez, desta vez nas hostes do papa Inocêncio III. Mas um sonho inesperado desviou-o do caminho da batalha. Ouviu que o chamavam pelo nome, lhe davam uma palmada no ombro e o levavam a formoso palácio, em que habitava uma belíssima noiva. Tudo isto devia referir-se a ele e aos que o seguissem. Alentado com o sonho, saiu para a Apúlia, e em Espoleto ouviu estoutra voz: «Francisco, a quem é melhor servir, ao amo ou ao criado?» Ele respondeu que ao amo. «Porque, então, transformas o amo em criado?», replicou a voz. A alma abriu-se-lhe à luz e respondeu, como Paulo: «Que queres que eu faça?» - «Volta ao lugar do teu nascimento e lá te será dito o que deves fazer».
De Espoleto voltou inteiramente mudado a Assis. Todos o notaram; já não era o jovem divertido de antes. Foi como peregrino a Roma e, para experimentar o que era a pobreza, comprou os farrapos a um mendigo e passou um dia inteiro, à porta de São Pedro, pedindo esmola.
Fora dos muros, não longe de Assis, havia uma igreja, a de São Damião, que ameaçava ruína. Francisco entrou para orar e ouviu: «Francisco, vai e repara a minha Igreja». Não foi preciso mais para se consagrar com toda a alma à reparação da ermida. Vendeu alguns panos, o cavalo e começou a pedir esmola; tudo entregou ao padre de São Damião. Reparou-se a igreja, mas Francisco continuou a mendigar. A rapaziada ria-se dele, atirava-lhe pedras e lodo; o próprio pai, envergonhado e irado, deserdou-o. O seu pai continuava a amaldiçoa-lo todas as vezes que o encontrava com o vestuário de mendigo. Um dia Francisco tomou consigo um pobre e disse-lhe: «Vem comigo e, quando ouvires o meu pai a amaldiçoar-me, eu dir-te-ei: - Abençoa-me, pai - . E tu farás sobre mim o sinal da Cruz».
No campo de Assis havia uma ermida de Nossa Senhora, chamada Porciúncula. Foi o lugar predilecto de Francisco e dos seus companheiros, pois na primavera do ano de 1200 já não estava só; tinham-se unido a ele alguns valentes que pediam também esmola, trabalhavam no campo, pregavam, visitavam e consolavam os doentes.
No Outono de 1212 embarcou em Ancona com ideia de passar à Síria para pregar aos Turcos. Uma tempestade obrigou-o a voltar à Itália e em 1213 saiu para Espanha, e segundo reza a tradição esteve mesmo em Portugal, a caminho da África; mas adoeceu e teve de voltar atrás.
Em 1215 e 1217 visitou novamente Roma, a seguir a França e em Junho de 1219 embarcou para o Oriente: Chipre, São João de Acre e Egipto. Em Damieta pregou o Evangelho na própria corte do Sultão. Voltou em 1220 a São João de Acre, na costa da Síria e peregrinou até aos Lugares Santos.
Quando voltou a Itália no verão de 1220, encontrou a Fraternidade dividida. Parte dos Frades não compreendia a simplicidade do Evangelho. No Capítulo Geral de 1219 tinham-se reunido cerca de 5.000 frades e no de 1221 Francisco esforçou-se por impor o genuíno espírito da Fraternidade, tal como ele o concebia.
Os dois anos seguintes foram a sua agonia. Da viagem do Oriente tinha voltado muito quebrantado. Em 1224, no retiro do Monte Alverne, chegou à máxima união a Cristo Senhor com a impressão das cinco chagas no seu corpo, e trouxeram-no de lá como relíquia viva. Aproximava-se a morte e quis que o levassem para Assis, onde chegou cego e onde o receberam os seus conterrâneos como Santo, não como mortal. Em São Damião compôs o hino do Irmão Sol e a seguir retirou-se para morrer na Porciúncula.
As sombras cobriam a planície, mas os cumes estavam iluminados pelo sol, símbolo da fraqueza corporal de Francisco e da sua grandeza espiritual.
Assim foi o Santo!

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Francisco, entre MUROS que caem e PESSOAS vivas


Semana Franciscana

Quando se ouve falar da vocação de São Francisco de Assis é comum ouvir contar o seu encontro com Jesus na igrejinha de São Damião. Á pergunta: “que queres que eu faça?”, Cristo teria falado, pedindo-lhe para reparar a sua casa em ruínas. É também bastante conhecido a dúplice compreensão de tal pedido: primeiro Francisco o teria interpretado materialmente, iniciando imediatamente a reconstruir aquela e outras igrejinhas em redor de Assis. Só num segundo momento teria entendido que era a esposa de Cristo, a comunidade dos crentes, a Igreja com “i” maiúscula a que devia reparar.
Pessoalmente acho que este modo de apresentar Francisco e a sua chamada seja insuficiente porque muito espiritualista por, ao menos, dois motivos: antes de tudo, a demasiada facilidade com que se fala de Deus, risca de esvaziar a experiência do homem e da experiência vital que possui. As experiências que São Francisco viveu antes da sua conversão - a sua participação na guerra, a sua tentativa de obter o título de cavaleiro- são fundamentais para compreender não só quem era Francisco, mas também quem se tornaria no futuro.
Facilmente ouvimos definir estas experiências como negativas devido àquela espécie de profunda desilusão que teriam deixado no próprio Francisco. O que é verdade, mas que não nos deve fazer esquecer que os acontecimentos da nossa vida são a nossa história, e é com esta que o Senhor entra em contacto: connosco certo, mas não com um nós desencarnado e abstracto, mas sim com aquele nós que tomou decisões e efectuou um certo percurso de vida.   
Lá onde, escolhas e caminho que delas se delineiam, não são reduzíveis a pacotes que podemos deixar de lado ao nosso belo prazer. Aquelas experiências constituem o nosso eu, a nossa realidade. Realidade com a qual - gostemos ou não - devemos aprender a fazer as contas. Tanto mais se, como Francisco, o nosso passado tenha sido doloroso. Mas existe um outro motivo que nos impede de reduzir a vocação de Francisco - toda vocação -  a um intimista relação homem - Deus. Existe um encontro na vida de Francisco que precede aquele com Cristo: o encontro com a realidade da lepra. Este - mais ou menos romântico episódio do beijo ao leproso - é o elemento que determina uma mudança radical no interior do jovem de Assis. Através deste impacto Francisco descobre uma dimensão da qual, até então, riquezas e boa vida tinham mantido longe. É uma dimensão humana, fortemente humana, onde este adjectivo sublinha a aderência à realidade e á vida. É por isto - para um crente - fortemente divina. Refiro-me não à dor mas á realidade da misericórdia, do coração que se faz terno e se activa diante da dor, da necessidade do outro, não mais visto como um inimigo (no nosso caso um portador de contágio) mas um pobre, um necessitado que move a minha pessoa ao socorro, a tomar conta, a cuidar, se o meu coração não tornou-se como pedra, se quero ainda ter a coragem de olhar para o espelho sem sentir nojo de mim mesmo. Vida concreta e relação de misericórdia: são estes antecedentes ao diálogo com o crucifixo de São Damião. 
Francisco efectuou uma longa e significativa evolução já dentro a primeira parte da sua vida e o seu coração iniciou a preparar-se para qualquer coisa maior que a procura de si mesmo, quando se abriu ao outro.  
Se, depois do olhar falante do Homem da cruz de São Damião, Francisco lança-se  numa busca apaixonada do seguimento de Cristo e do seu Evangelho - aventura que o levará à santidade, mesmo que através de um itinerário não privo de ilusões, passos falsos e recaídas - foi porque tinha procurado já antes: Jesus lança a sua proposta de realização segundo os seus critérios numa existência que desejava profundamente o bem para si, mesmo se a sua busca até então, se tinha concentrado em realidades que o tinham desiludido: poder, violência, fama, honra, dinheiro, haveres. E a caridade de Cristo, aquele amor generoso até o absurdo que sobre a cruz se manifesta na sua máxima evidência, não se radica num coração que se nutre de injustiça e de egoísmo: só um Francisco que se abaixa diante do leproso com misericórdia, pode acolher a proposta que Jesus faz aos seus discípulos: “toma a tua cruz de todos os dias e segue-me”. Dando um ulterior passo em frente. Jesus não mostrou-se espantado diante da história dos seus discípulos mesmo que fossem pecadores, pobres pescadores ou meio delinquentes. Dirá a Pedro: “não temas, farei de ti pescador de homens”. E lhes gritou, muitas vezes até com dureza, quando esqueciam ou tinham dificuldades em comportar-se como homens. Ressoa também para nós, ainda hoje, aquele: “não compreendeis ainda? Tendes o coração endurecido?” Vocação, portanto, como conhecimento, escolha e vida atrás de Jesus, certo. Mas com os pés bem radicados na própria história, qualquer ela tenha sido, e dentro uma humanidade autentica, descoberta e acolhida.  

Atualidade

O carinho do Papa Francisco que irrita muitos padres

É uma coisa maravilhosa mas, por exemplo, também João Paulo II foi à cadeia encontrar o seu assassino Ali Agca. Mas desta vez, aposto, ...

Aqui escreves TU