sábado, 10 de março de 2012

Templo vivo!

Depois de ter-nos conduzido à silenciosa pobreza do deserto, onde emergiu aquilo que existe no homem e depois sobre o místico monte da transfiguração, onde se manifestou a grande confiança do Pai na humanidade assumida pelo Filho, a liturgia deste Domingo imprime uma aceleração no nosso caminho quaresmal levando-nos ao lugar sagrado por excelência, onde aparece qual é o culto e qual é a humilhação que o homem está a viver diante de Deus. Ali Jesus, devorado pelo zelo e tomado por uma ira incontenível, reage com veemência ao triste espectáculo de uma casa de oração reduzida a empório do sagrado: «então fez um chicote de cordas e expulsou-lhes para fora do templo». As palavras que acompanham este gesto profético permite-nos compreender a origem de tanta intolerância: «Tirai tudo isto daqui; não façais da casa de meu Pai casa de comércio» (Jo 2, 16). A partir do seu relacionamento filial com Deus, Jesus não pode senão interpretar como uma dramática deformação um culto religioso alimentado por uma mentalidade de tipo económico. Não só porque as lógicas do mercado são profundamente incompatíveis com a gratuidade sobre a qual se fundam as relações autênticas, mas ainda mais porque a ideia de ter que se apresentar a Deus com uma oferta adquirida exprime a não aceitação daquela pessoal e radical pobreza que é chamada a entrar em aliança com o poder de Deus. O Senhor Jesus enche-se de ira diante de uma religiosidade construída sobre a remoção e não sobre a aceitação da realidade, onde alguém se vê obrigado a encher as mãos de presentes em vez de doar a verdade do próprio existir. As palavras do apóstolo são testemunho daquele diferente modo com que Jesus Cristo interpretou a aventura da sua humanidade, não como um lugar para encher com bens supérfluos, mas como um templo em que a fraqueza não é somente planamente acolhida mas também celebrada e levada á salvação: enquanto os judeus pedem milagres e os gregos procuram a sabedoria. Nós, pregamos Cristo crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os gentios ( 1Cor 1, 23). Antes de ser manifestação do amor maior, a cruz revela a absoluta mansidão com que o Verbo escolheu levar a escolha da encarnação. A meio deste tempo de purificação e de preparação para a celebração do Mistério pascal, a liturgia deste Domingo nos reconduz à nossa realidade de criaturas, necessitadas de reconciliar-se com a própria fraqueza. Neste êxodo do medo daquilo que somos para a alegria de sermos amados, Deus nos acompanha desde sempre com os dez mandamentos, ensinamentos de vida que nos recordam como é impossível entrar na promessa da terra sem aceitar a providencial e complexa trama de dependências com os quais se compõe o tecido da nossa vida.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Atualidade

O carinho do Papa Francisco que irrita muitos padres

É uma coisa maravilhosa mas, por exemplo, também João Paulo II foi à cadeia encontrar o seu assassino Ali Agca. Mas desta vez, aposto, ...

Aqui escreves TU