terça-feira, 20 de março de 2012

Não sem nós!



Depois de ter contemplado o povo como uma vale de ossos ressequidos (Ez 37), o profeta Ezequil recebe a grandiosa visão da salvação de Deus semelhante a um templo trasbordante de águas terapêuticas, uma cascata imparável de vida e de graça «todo o ser vivo que nela se move terá novo alento e o peixe será muito abundante. Porque aonde esta água chegar, tornar-se-ão sãs as outras águas e haverá vida por toda a parte aonde chegar esta torrente.» (Ez 47,9).
Diante deste cenário poderoso, símbolo do qual fazemos experiência já dos rios de água viva do mistério pascal, se põe uma pergunta: «Viste, filho do homem?» (Ez 47,6) que torna-se uma útil revisão do nosso caminho quaresmal: o que consegui ver - e reconsiderar - nestes dias de graça? Na presença de que volto temos escutado, rezado, empenhados na caridade e no abandono de nós mesmos? Serve uma revisão a meio do caminho, porque a cura do nosso espírito não pode acontecer em anestesia total. Existem, de facto, aspectos da nossa humanidade que esperam a redenção toda uma vida, como aquele homem de que fala o Evangelho de hoje, doente há trinta e oito anos (Jo 5, 5). Mas estar muito tempo doente não significa necessariamente ter também vontade de assumir a cura. Este homem, desde sempre imóvel, parece prisioneiro da resignação, prelúdio de todo vitimismo: «não tenho ninguém que me introduza na piscina, quando a água é agitada; enquanto eu vou, outro desce antes de mim» (Ez 5,7). 
O Senhor Jesus o conduz a modificar o olhar, mudando a atenção das circunstâncias externas - à primeira vista desfavorável -  àquelas internas, com uma pergunta que, só aparentemente é desnecessária: «Queres ser curado?» (5,6). 
Este é o segundo ponto da pergunta que hoje nos quer fazer reflectir. Na vida espiritual não existem curas de massa, nem impessoais. O primeiro passo que nos é pedido é sempre a disponibilidade para assumir a nossa história e aceitar que a salvação de Deus se cumpre gradualmente, no difícil e maravilhoso jogo do confiar quotidiano, da relação autêntica, de pequenos actos de obediência à realidade, nossa primeira aliada no êxodo da escravidão dos medos para a liberdade dos filhos de Deus. 

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