Voltar a crer e esperar!

Ó vós todos, que passais pelo caminho,
Olhai e vede se há dor igual à minha dor!” (Lm 1,12)

Cerca um mês atrás a pequena cidade de Ceva, onde vivo já alguns meses, foi abalada pela morte de um jovem de 24 anos vitima de um acidente automobilístico. Este trágico evento chocou profundamente todos os cebanos (aqueles que são de Ceva), de modo particular os jovens. Marco (assim se chamava a vitima) era muito conhecido e muito amado. Era um apaixonado pela montanha (como um bom piemontese) e pelo ciclismo. Quando uma vida (em qualquer idade mas sobretudo se jovem) é assim brutalmente e inesperadamente ceifada reacendem na consciência colectiva perguntas fundamentais sobre a nossa existência e sobre a possibilidade ou não da existência de Deus. Se ele existe as dúvidas e, compreensivamente, a revolta ganham proporções ainda maiores. Sobretudo se aqueles que se declaram crentes e, inclusive,  ministros deste Deus que definem como amor não souberam calar e rezar e tentarem “justificar” o sucedido reclamando o “destino” ou, pior ainda, a justiça de Deus. 
Os pais do saudoso Marco (Marco era filho único), frequentadores do nosso convento, depois de algum tempo de ausência, hoje voltaram para a Missa das cinco. No fim da Missa gentilmente quis cumprimentá-los e surpreendentemente, não sem algumas lágrimas,  disseram-me: “com a partida de Marco foi-se também um pedaço de nós e da nossa felicidade mas agora temos que encontrar forças para voltar a crer e a esperar”. Talvez quisessem da minha parte um discurso de consolação ou de confirmação mas eu não tive forças de pronunciar palavras limitei-me a abraçá-los e a segredar-lhes: “vos acompanho na oração”. Não sei se o meu abraço e a certeza da minha pobre oração transmitiram-lhes a minha veneração e a minha total sintonia com com a sua dor. 
Estou certo que estes pais, trespassados pela “espada da dor” como Maria mãe de Jesus, meditando a tragédia da morte de um filho único encontrarão uma forte relação com a morte de um Outro Filho único: Jesus. Estou certo que saberão, talvez daqui a tantos anos, a reler estas duas mortes dramáticas á luz da revelação de um Deus que é sempre fiável. Sim, porque o mistério da Cruz, depois de um inicial espavento e descrédito, possibilita curiosamente o aproximar-se e o afirmar-se de uma fé sem precedentes. (Cf. O centurião vendo Jesus morrer afirma: “verdadeiramente este homem era Filho de Deus”). Somente a presença daquele que atravessou a existência humana com todas as suas imprevisibilidades e dramaticidades, inclusive o sofrimento e a morte inocente, sem nunca deixar de fiar-se incondicionalmente no amor de um Deus que ele chama de Pai. Cristo crucificado é a única presença capaz de habitar e de encher a solidão do corpo e do espírito que experimentam aqueles, como os pais de Marco, a perda de um ente querido como um filho único. É a este “homem das dores” que eu não cesso de rezar para que possamos todos, quando formos visitados pela dor, pelo sofrimento e pela até morte, continuar com os olhos fixos em Deus e possamos, atravessado o deserto da solidão cantar com Francisco de Assis: “Louvado sejas tu, ò meu Senhor, pela nossa irmã a morte corporal”. Estou convencido que na sua cruz Jesus não somente redimiu o homem mediante o sofrimento, a dor e a morte mas o próprio sofrimento, a dor e a morte foram redimidas.  É a ele que confio esta família: os pais e o filho único: MARCO.

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